quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Em mim

Depois da quarta vez que bateu na porta e aquele de dentro não respondia, resolveu que ia arrancá-la dali num só golpe. Abreeeeeeee. Ia se espalhando num refluxo inevitável a atmosfera de obscenidade da intimidade tempestuosa dos dois. AAAAAAAAAAbraaaa. Chorava quente de queimar o rosto, viver poderia ser bom quem sabe até pros vizinhos que ouviam, aquilo era uma lógica interna, internalizada, um universo sem remédios de dores e gozos extremamente particulares. Aquele de fora ia empurrando a porta com os ombros, depois pegou uma cadeira velha e correu uma pequena distância no apartamento apertado, explodiu a fechadura e caiu dentro do banheiro mergulhado na penumbra. O mundo ali dentro era desmontado e ardente, o de fora pensou que poderia ter evitado chegar até ali, e dessas coisas que se pensa sem querer, pensou no primeiro dia, a criação, se arrependeu de novo. Pega! Prova! Toma! gritava o de dentro, ou era o de fora, ou ambos, ou apenas esse vazio oco que criaram e em que entraram pra sempre e se perderam pra sempre e sem fim.