domingo, 26 de fevereiro de 2012

Estreito

Eu provocava nele coisas terríveis, imensuráveis. Dentro do peito, em um segundo. Amor que dá vontade de viver (ele e a vida, e ele na vida). E eu coreografava gestos pra melhor tocá-lo, o meu amor, e para deixar de tocá-lo, quando meu toque falhasse ou quando pudesse, quem sabe, ser melhor em ânsia que em presença. Eu beijava as costas do meu amor, com as unhas roçando a lateral do dorso pra que ele (o meu amor) se lembrasse de mim assim, nos lugares e cruzamentos dos sentidos onde ninguém mais seria capaz de mapear igual ou próximo. Eu virava o meu amor de frente e enfrentava os olhos como os de alguém querido, ou de um inimigo desmedido. Tudo isso fortemente, pra que tudo fosse grande, como tudo podia ser e nunca o é. É grande e vivo dentro de nós e não sai. Farras hormonais com meu amor dentro de nós, e os corpos se flechando e se metendo um no outro em encaixes perfeitos, a pele de um réptil, lisos, nus, no ar, dias na cama suja com meu amor. Rimos muito quando nos reencontramos mais velhos e mais leves. Todas as questões impronunciáveis rapidamente vomitadas com cerveja. Abraço forte de despedida no meu ex-amor que fica, pena e ternura inflando meu coração violento. Tudo certo com meu ex-amor, agora estou lançado (por ele) à vida e aos outros. Lancei-o igualmente, com a alegria duradoura que consegui desejar-lhe num futuro sem mim, mas com meus dogmas incrustados. E eu estarei, portanto (e contudo) no meu amor, nos seus amores próximos. Fiquei derramado do cabelo às costas e delas ao sexo, feito uma pele nova para seus novos prazeres. E fico bem, e vou-me bem, e deixo-o bem, imenso e tudo que me foi, não por isso menos inexato e triste: deixo-o, sem deixá-lo, vou sem ir, guardo-o bem dentro, no centro do nada, pra esquecê-lo, lembrando sempre do meu amor, o meu isso, o meu aquilo, a minha pele (talvez também), e as outras coisas indizíveis que preciso dizer antes de ir.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Escrever tem sabor de merda

(cartas e raízes)
casas de juízes
fartas e felizes
martas e luíses
e casas de meretrizes
e crises nos países:
kkkkartas e hahahaízes

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

de boca

preciso de um lugar para as minhas baleias, meus elefantes, cavalos e pássaros.

preciso da liberdade de um amor e de muita água.

preciso ter o céu como gaiola.

tudo isso aos poucos, existindo em silêncio.

preciso de um emprego.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Garras

Tijolinhos de cozinha me trouxeram para a cidade com garras. Aqui n~ao tenho mais l'ingua.

Aqui n~ao tenho mais meus sinais. Mais um no mundo de falantes desesperados.



Aqui me sinto em casa, boas casas de nunca mais, com gente esquecida, com amigos de sempre. Pragas, maldi'coes e venturas. Bons acertos que sucedem os erros. Minha linguagem ainda 'e a dos verbos. Pobre e simples.

Um rio e quatro pontes. Alegria 'e dif'icil de se p^or pra dentro. Quem disse?


Eu vi.